sábado, 1 de maio de 2010

Foz de Iguaçu (PR): as várias faces de uma cidade POR:Antonio Ozaí da Silva*

Uma idéia na cabeça, uma câmara na mão. Resultado: um excelente documentário sobre Foz de Iguaçu (PR). As muitas faces de uma cidade, produzido por Danilo Georges e Eliseu Pirocelli, revela as contradições do espaço urbano, geralmente ocultadas pelos interesses políticos e econômicos dominantes.

De maneira perspicaz, as cenas iniciais traçam um paralelo entre a cidade idealizada para efeito de propaganda turística e a outra cidade desconhecida pelo turista. De fato, o olhar do turista, em geral, é para as paisagens que são apresentadas nos cartões-postais. Turista quer se divertir, ver o belo espetáculo da natureza, etc. Seus olhos são seletivos. O objetivo é o deleite. A realidade que persiste paralelamente à cidade vista pelo turista gera desconforto. Como afirma o DJ Caê, a administração pública prioriza a cidade a ser mostrada ao turista: “Eles se preocupam muito em deixar a cidade boa pro turista, pra quem tá vindo de fora, mas, não se preocupam tanto para quem tá aqui”.

O documentário mostra o outro lado da cidade: os bairros periféricos e favelas como Cidade Nova, Passarela (Vila C), Favela do Queijo, Favela Jd. Paraná, Morenitas. Nestes espaços a vida também pulsa com toda a intensidade, mas a grande mídia, predominantemente, atenta apenas para a miséria e violência. Dessa forma, alimenta o preconceito contra os pobres. Este aspecto é enfatizado no documentário e as palavras de Vera Malaguti resumem-no bem: “A imprensa é estimuladora do medo. As razões maiores do aumento da violência não são discutidas, então, a gente não caminha para a frente”. As imagens e falas registrados são uma denúncia de uma certa postura elitista que culpabiliza e criminaliza os pobres pela situação em que se encontram, e, assim, desconsidera as estruturas políticas, econômicas e sociais que os mantêm nestas circunstâncias.

Pobreza não é sinônimo de ausência de cultura. As condições sociais e econômicas não permitem o acesso à chamada “cultura culta e erudita”, mas as dificuldades e necessidades também estimulam a criatividade e a emergência da cultura e arte popular como a de Mano Edo, artesão que constrói casas e uma cidade em miniatura. Há também expressões culturais como o Rap e o Hip Hop. É uma cultura de resistência.

Um dos méritos desse documentário é não cair na tentação da apologia da miséria. Os moradores da periferia não são apresentados apenas como vítimas de uma cidade injusta e desigual, mas enfaticamente enquanto indivíduos criativos que resistem e lutam para superar a realidade e os mecanismos que os oprimem.

As muitas faces de uma cidade é também uma denúncia contra a concentração dos meios de comunicação. A população da periferia torna-se refém da imagem que a mídia constrói sobre ela e, especialmente, do ocultamento de que é vítima na medida em que priorizam-se os aspectos para consumo turístico. A isto soma-se as enormes dificuldades para o acesso aos meios de comunicação comunitários que expressem sua fala e cultura. O documentário mostra as múltiplas faces da cidade Foz do Iguaçu e propicia uma forma de expressão dos diretamente envolvidos neste drama humano e das manifestações culturais que, apesar de tudo, eles produzem.

“Queremos ver o dia, em que os estudos sobre a violência dos de baixo, cedam lugar aos estudos sobre a rede de solidariedade entre os pobres, sobre suas sociabilidades, suas formas de lazer e de construir o mundo” (Milton Santos).

É com estas palavras que o documentário é finalizado. Elas sintetizam bem o que vemos e ouvimos nos pouco mais de 30 minutos de duração. Os produtores de As muitas faces de uma cidade conseguiram ser fiéis a este propósito.

Ps.: Obrigado ao Danilo Georges pelo envio do DVD e a oportunidade de assisti-lo.

*Antonio Ozai é docente no Curso de Ciências Sociais na UEM. editor da revista Espaço Acadêmico e escritor de diversas obras entre elas "As têndencias das Esquerdas no Brasil.

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